Escritor de Amambai ganha prêmio nacional de crônicas
A primeira colocação para o escritor amambaiense veio com a crônica “Predileção por Inutencílios”
O médico e escritor de Amambai, Dr. Diobelso Teodoro de Souza, foi o primeiro colocado em um concurso nacional de literatura, realizado no estado do Paraná.
O escritor, que faz parte da Academia Amambaiense de Letras (ACAL), venceu o concurso nacional na categoria “crônica”.
A primeira colocação para o escritor amambaiense veio com a crônica “Predileção por Inutencílios”. O segundo colocado foi o escritor Cleber Souza Cordeiro, de Fortaleza, Ceará, com a crônica Olhares Vernáculos e o terceiro colocado foi o escritor Ricardo Lahud, de Guarujá, estado de São Paulo, com a crônica O Novo Eremita.
O concurso nacional foi realizado em 2015, mas o resultado oficial só foi divulgado agora, em janeiro de 2019.
Veja a crônica de Dr. Diobelso, que levou o título nacional do Paraná
PREDILEÇÃO POR INUTENSÍLIOS
Acho que nasci com a predisposição pra apreciar o que não presta muito ou o que é desajustado, recusado.
Procuro serventias em certas aparelhagens desusadas e utensílios que ninguém quer pra nada. Costumo recuperar algumas coisas, mas pode levar tempo. Peço que não reparem muito nesse defeito meu: é que devo estar voltando às minhas origens, depois de algumas décadas.
Isso começou quando era bem menino: conseguia brinquedos despedaçados e formava palácios em meus reinados: de uma rodinha grudada num eixo de arame eu fazia um redemoinho tocando valsa. Um helicóptero de três hélices eu já fiz de uma cabinezinha de ambulância sem porta, sem nada. De uma flauta quebrada, grudada num pedaço de alumínio, eu tive a artimanha de fazer um passarinho de uma asa só que cantava muito.
No 3º. Ano Primário, a Professorinha Vânia Medeiros disse que os poetas podiam provocar reajustes nos corações e até fazer reparos em almas despedaçadas, às vezes até com uma só palavra. Bastava que ela tivesse sido bem polida e engrenada.
Daí eu também procurei desenvolver essa capacidade besta: juntava palavras e pontuações que não eram muito usadas nas redações e trabalhos escolares e comecei a fazer alguns versinhos.
Isso não adiantou muita coisa: não consegui alcançar, na época, o coração da tímida loirinha Floriana e não me lembro, até hoje, de ter ajudado recuperar nenhum suicida de paixão braba em Pronto Socorro ou em minhas Visitas Domiciliares.
Com uns treze anos de idade, fiz um time de futebol da gurizada que nunca era chamada para jogar nos times bons. Enfrentamos a seleção da cidade: ganhamos de 2 a 1, lá no Campão do Japonês, perto da Zona, em Glória de Dourados-MS. Tava empatado 1 a 1 e fiz um golaço que não esqueço nunca: de falta, no meio da barreira à direita, que se abriu.
Na UFMS, em 1979, formei o “Anistia”, só de caras rejeitados pelos outros times: não deu muito certo, a gente só perdia, eu era o 10, imaginem. Mas servia para tomar umas no Bar Anestesia, ouvir histórias do Zé Garçom e se aliviar depois das provas.
Devo ter virado médico devido essa necessidade de recuperar coisas que não prestam tanto e de andar com gente que não funciona direito. Pode ser uma predileção: às vezes dá certo, mas não é muito culpa minha. Tem gente que gosta muito dos seus desconcertos, que nem eu, e daí eu não mexo com elas. Já estão prontas.
Nunca gostei de usufruir só do bem bom. O melhor pra mim sempre foi fazer medalhas de tampinhas amassadas e conquistar reinados debaixo dos pés de manga do quintal. Por ali eu sempre me senti um rei.
Penso que sempre fui um Rei Menino que nem o Tuti. Só que ele gostava muito de armas de brinquedo revestidas de ouro egípcio. Eu não: minha arma sempre foi aproveitar objetos despedaçados, brincar com coisas inúteis e desconfiar do que é feito só pra machucar.
É que sempre fugi dos falatórios esquinados que ferem o corpo: prefiro a solidão dos cochichos de insetos e de pardais idiotas: ainda aprendo muito com eles.
Meus carrinhos tinham rodinhas de mamonas e, mesmo assim, conseguiam ser rápidos demais. Tanto que fugiram dos meus sonhos atuais.
Agora vivo atrás deles.
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