Homenagem | Jeozadaque | 16/08/2010 11h51

Poema de Manoel de Barros encerra edição de 25 anos do Criança Esperança

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A atriz Cássia Kiss recitou o poema “O menino que carregava água na peneira”, de Manoel de Barros, no fim do programa especial de 25 anos do 'Criança Esperança', promovido pela Rede Globo em parceria com a UNESCO. O evento realizado no último sábado (14) reuniu cerca de nove mil pessoas.

Manoel de Barros é considerado um dos mais importantes poetas brasileiros. Nasceu em Cuiabá (MT) e atualmente vive em Campo Grande, em Mato Grosso do Sul.

Recebeu o “Prêmio Orlando Dantas” em 1960, concedido pela Academia Brasileira de Letras ao livro “Compêndio para uso dos pássaros”. Em 1969 recebeu o Prêmio da Fundação Cultural do Distrito Federal pela obra “Gramática expositiva do chão” e, em 1997, o "Livro sobre nada” recebeu o  Prêmio Nestlé, de âmbito nacional. Em 1998, recebeu o Prêmio Cecília Meireles (literatura/poesia), concedido  pelo Ministério da Cultura.

Confira o poema na íntegra:

“O Menino que Carregava Água na Peneira”

Tenho um livro sobre águas e meninos

Gostei mais de um menino 

que carregava água na peneira.

A mãe disse que carregar água na peneira

era o mesmo que roubar um vento e sair

correndo com ele para mostrar aos irmãos.

A mãe disse que era o mesmo que

catar espinhos na água

O mesmo que criar peixes no bolso.

O menino era ligado em despropósitos.

Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.

A mãe reparou que o menino

gostava mais do vazio

do que do cheio.

Falava que os vazios são maiores

e até infinitos.

Com o tempo aquele menino

que era cismado e esquisito

porque gostava de carregar água na peneira

Com o tempo descobriu que escrever seria

o mesmo que carregar água na peneira.

No escrever o menino viu

que era capaz de ser

noviça, monge ou mendigo

ao mesmo tempo.

O menino aprendeu a usar as palavras.

Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.

E começou a fazer peraltagens.

Foi capaz de interromper o vôo de um pássaro

botando ponto final na frase.

Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.

O menino fazia prodígios.

Até fez uma pedra dar flor!

A mãe reparava o menino com ternura.

A mãe falou:

Meu filho você vai ser poeta.

Você vai carregar água na peneira a vida toda.

Você vai encher os

vazios com as suas

peraltagens

e algumas pessoas

vão te amar por seus

despropósitos.

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