A mudança está na distribuição do poder simbólico
Não dá para ficar em silêncio diante do caso do ator que simula, entre risos e aplausos, a agressão sexual contra uma mãe de santo transmitida em rede nacional de televisão. Esta história escancara mazelas da nossa sociedade sobre as quais nenhuma pessoa minimamente comprometida com a vida brasileira pode se omitir.
Primeiro, evidencia, mais uma vez, a naturalização da violência contra as mulheres, a subjugação do corpo feminino por uma cultura machista e destrutiva. Depois, o preconceito contra religiões de matriz africana e, por fim, expõe o uso abusivo da televisão, uma concessão pública, que deve servir e honrar a cidadania em vez de desrespeitar, segregar e agredi-la.
Não sou chegado a moralismos do tipo politicamente correto, que cerceiam o riso, a troça ou o sarro, como se diz na Bahia. Sou ainda menos adepto do modismo do bullying, tão apropriado à sociedade norte-americana, quanto inadequado ao nosso modo de vida. Não é por aí.
A cena patética que o ator decadente diverte o público simulando sexo violento fala do nosso eu profundo, da matriz de violência e desprezo reproduzida incessantemente nas telas e em nossas relações cotidianas.
A cena, ao mesmo tempo em que mostra a nossa verdadeira face, nos indaga: é assim que queremos ser para sempre? A verdade é que estamos diante de uma encruzilhada civilizatória. Chegou a hora de fazermos as escolhas que definirão o nosso lugar no futuro.
Não há dúvida de que é na rota da comunicação e da cultura, e não simplesmente pela via da ascensão econômica, que faremos a travessia para uma sociedade justa e igualitária onde todos, homens e mulheres, poderão exercer não apenas cidadania e direitos de contribuinte, mas também sua singularidade e sua subjetividade livres de qualquer forma de opressão e preconceito.
Em pleno Brasil do século XXI, salvo bravos movimentos de resistência, estes direitos ainda se restringem a grupos dominantes estruturados na cultura dos homens brancos, conservadores, ocupantes do alto da pirâmide econômica e cultural.
Como ministro da cultura, antes de tudo, trabalho pela democratização da liberdade de expressão e pela ampliação do acesso ao poder simbólico – o direito de produzir e compartilhar significados, visões de mundo e valores culturais. Isso passa pela produção de políticas públicas de democratização dos meios de comunicação, passa pela ampliação do acesso à cultura e, ainda, pela abertura de amplos canais de participação social na vida pública.
É por aí que vamos consolidar a nossa democracia, construir uma sociedade baseada no amor e na generosidade e encontrar o nosso lugar no mundo contemporâneo.
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