A especialista em Educação Especial para deficientes visuais, Sônia Queiroz, transforma reciclados em simbologias regionais

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Exposição | Ayanne Gladstone | 10/04/2022 08h36

Artista visual utiliza materiais recicláveis em exposição sensorial no Memorial da Cultura

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A especialista em Educação Especial para pessoas cegas ou com baixa visão, Sônia Aparecida Lins de Queiroz, conhecida pelo nome artístico Sônia Queiroz, é a artista por trás da exposição ‘Arte Sensorial Na Palma da Sua Mão’, evento que expõe uma série de quadros sensoriais confeccionados com materiais recicláveis. Sônia utiliza tampinhas de garrafa, pedras, lápis de cor, lã, algodão, penas naturais colhidas no Horto Florestal de Campo Grande, restos de sabonete e até mesmo uma antena parabólica para recriar a fauna, flora e os povos nativos do Estado e também simbologias referentes ao mundo atual. Diferente das exposições tradicionais, os quadros de Sônia podem ser tocados e contêm até mesmo aromas.

A artista plástica explica que foi por meio da Educação Especial que começou a trabalhar com a adaptação de materiais, de modo que pudesse transformar a arte numa prática acessível para deficientes visuais que se apoiam no tato. “Vendo a necessidade do cego ir para um espaço público, visualizar outras informações. A visão dele está no tato, a sensibilidade é mais aguçada. Uma vez eu estive com um grupo de cegos e nós fomos para uma exposição. E enquanto eu fazia a audiodescrição dos quadros, eles me propuseram a fazer um quadro para eles visualizarem o que estava realmente na descrição”.

Sônia conta que sua primeira arte sensorial foi um quadro produzido para o Núcleo de Produção Braille da Secretaria Municipal de Educação (Semed). A artista plástica afirma que seus quadros são pensados para a comunidade de pessoas cegas e de baixa visão e para todos os públicos, porque é uma arte inclusiva. “Você tem quadros que podem ser riscados. Ele solta um cheiro, um aroma. E outros você, só no toque ou no olhar, percebe qual o seu significado. Essa é a proposta, dar significado ao que você está vendo, ao que você está tocando”.

Sônia é uma artista autodidata e explica que aprendeu sozinha a produzir as pinturas em relevo, modelagens e costuras em seus quadros. “Bem da imaginação mesmo, da criatividade”.

Eu Amo Essa Morena

Durante o mês de exposição, Sônia dá continuidade a produção de um quadro intitulado 'Eu Amo Essa Morena', a imagem de uma índia em alto-relevo que homenageia Campo Grande e Mato Grosso do Sul.

“É uma índia que eu estou fazendo. É a representação mais morena do nosso estado”.

A índia, Morena, faz alusão ao apelido de Campo Grande, Cidade Morena (Foto: Roberto Medeiros/Ensaio Geral)

O mundo ao avesso

Em seu quadro intitulado ‘O mundo ao avesso’, Sônia utiliza uma antena parabólica para dar molde ao universo que rege a Terra. O planeta utiliza uma máscara descartável e está sob uma pomba branca com asas abertas. Ao lado, uma seringa sobre um coração representa a vacina contra a Covid-19. A artista explica que o mundo virou do avesso após a chegada da pandemia e que todos os elementos da imagem representam esperança. “É um quadro que futuramente vai ser histórico, porque isso [pandemia] vai passar, se Deus quiser. Isso vai passar, mas nós ficaremos com o que aconteceu nessa época”.

A antena parabólica ganha um novo significado sob a simbologia pandêmica (Foto: Roberto Medeiros/Ensaio Geral)

Nossa Senhora do Silêncio

Ao lado da pintura em alto-relevo de Nossa Senhora do Silêncio, Sônia confeccionou a Oração da Ave Maria em braille. “Você pode saber que é um quadro sensorial, um quadro específico para deficientes visuais. Eles podem tocar, esses quadros todos podem ser tocados. Diferente de outros que não se pode usar o toque, todos os meus quadros podem ser tocados. Podem não, devem ser tocados e sentidos”.

A pintura possui pequenos cristais de pedraria para aprofundar o alto-relevo (Foto: Roberto Medeiros/Ensaio Geral)

Uno - Ipês Coloridos

Feito com sobras de massa acrílica utilizada em um trabalho produzido na Biblioteca Pública Municipal Anna Luiza Prado Bastos, Sônia recriou um Ipê com todas as cores em uma única árvore. Sobre a tela é possível visualizar o rosa, roxo, amarelo, branco, laranja e até mesmo o verde. “Lá na Biblioteca Municipal tem uma história contada em poesia sobre o Ipê”.

Sônia explica que o Ipê-amarelo é símbolo de Mato Grosso do Sul (Foto: Roberto Medeiros/Ensaio Geral)

Braille e reciclados

Sônia informa que uma característica específica de seus quadros é sua assinatura visual. Junto das letras S e Q, de Sônia Queiroz, há a presença de três pontinhos feitos com cristais de pedraria. “Esses três pontinhos significam que é a minha assinatura em braille”.

Quanto à interpretação de suas obras por pessoas cegas e de baixa visão, a artista evita que os materiais recicláveis componham um significado muito abstrato. Sônia esclarece que seus quadros devem oferecer significado quando tocados e que possui muitos parceiros para contribuir com seu trabalho. “Eu pego material das minhas costureiras, das pessoas que juntam pra mim. Tem muito parceiro, muita gente que olha e já sabe o que eu faço com esses materiais, então trazem pra mim”.

A reciclagem também tem destaque na moldura de suas telas. Sônia utiliza madeira para substituir os quadros tradicionais. No lugar da tela, a artista cria suas pinturas sobre pano e algodão cru, por exemplo. Sônia leva seus trabalhos para outros municípios e declara que, caso seja convidada, está disposta a levar sua arte sensorial para fora de Mato Grosso do Sul. “Não é só um quadro, ele trabalha com emoções, com sensações. Tanto para crianças, quanto para adultos, quanto adolescentes”.

Serviço

Exposição 'Arte Sensorial Na Palma da Sua Mão'

O Memorial da Cultura Cacique Enir Terena está localizado na Rua Terena S/N I Aldeia Urbana Marçal de Souza, Bairro Tiradentes.

A exposição permanece aberta para visitação das 7h às 17h, do dia 7 a 30 de março.

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