Dança | Da redação/com FCMS | 21/05/2015 11h20

Cia. do Mato apresenta espetáculo baseado em Clarice Lispector

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A Cia. do Mato apresentou na noite desta quarta-feira (20), durante a Semana Pra Dança 2015, no teatro Aracy Balabanian do Centro Cultural José Octávio Guizzo, o espetáculo “Mudança”, baseado na poesia de mesmo nome de Clarice Lispector. O trabalho foi contemplado com o Prêmio Célio Adolfo de Incentivo à Dança na categoria artista consolidado/montagem 2014.

A noite começou do lado de fora do teatro, na entrada, onde as pessoas formavam fila para assistir ao espetáculo. Foi montada uma infraestrutura em que foi exibido o vídeo Valtari, de Christian Larson, da Suécia. A exibição de trabalhos de videodança antes das apresentações faz parte do Festival Cuerpo Digital – Mostra “Miradas Corporales”, com curadoria de Sofía Orihuela, da Bolívia.

Logo após as portas foram abertas e as pessoas tiveram acesso ao teatro. Os bailarinos já estavam no palco, aguardando o terceiro sinal. Anayara Martins, Debora Rosa Higa, Nathalia Spósito, Tanara Maciel, Paulo Henrique, Tayla Borges, Ana Carol e Leonardo Borges convidaram o público a entrar no universo das transformações que a poesia de Clarice Lispector evoca.

A Cia. do Mato, neste trabalho, questiona a si mesma e ao público “o quão é importante sair da rotina, experimentar novos caminhos, saborear novas conversas; descobrir corporalmente a fragilidade da mudança e a coragem e arriscar tudo por um algo mais”.

A direção artística é de Chico Neller, iluminação de Expedito di Montebranco, trilha sonora de Jonas Feliz, figurino de Jane Rosa e preparação corporal de Júlio César Floriano.

Após a apresentação, o público teve a oportunidade de entrar em contato com os artistas, o diretor, o iluminador e a crítica de arte Sandra Meyer, professora do Curso de Artes Cênicas da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), convidada pela Fundação de Cultura para participar dos debates com o objetivo de pensar e refletir a dança em Mato Grosso do Sul.

Uma das espectadoras questiona a presença da nudez no espetáculo. O diretor Chico Neller responde que no início da concepção do trabalho ele não pensou em nudez. “Daí a gente foi testando, experimentando coisas e chegamos a esse figurino. Para mim a sensação dos cachorros é muito mais forte por si mesma. A ideia é muito mais forte que a imagem, mas fomos testando e ficou assim”.

Chico fala também sobre a criação do grupo: “A Cia. do Mato foi criada há 16 anos para participar dos festivais de Joinville. Depois fomos saindo dos festivais e nos profissionalizando. Já estamos há dois anos neste processo e ‘Mudança’ é a situação onde a companhia está e para onde está caminhando agora”.

A crítica Sandra Meyer intervém dizendo que os coreógrafos têm certas limitações nos festivais competitivos, como o tempo dos trabalhos, por exemplo. “Essa é uma das coisas mais difíceis. Daí a possibilidade de se profissionalizar e sair apenas deste circuito”.

Uma pessoa na plateia perguntou ao diretor o que seria para ele o pensamento contemporâneo. Chico responde que mesmo quando participava dos festivais em Joinville, vem pensando em tomar cuidado para a dança contemporânea não ser tendenciosa. “Começa a se repetir, não quero rótulos, nada, nem ter medo de experimentar. Os trabalhos hoje são muito lineares. Não estou preocupado se a dança que faço é contemporânea, penso em fazer dança sem muita preocupação sobre o lugar em que a gente estaria neste momento”.

Outro espectador que acompanha os trabalhos de Chico Neller desde a década de 1990 perguntou como ele consegue manter a inspiração deste aquela época. O diretor do “Mudança” explica que está descobrindo muita coisa agora. “Sou muito dramático. Eu achava que eu era sutil, uma pessoa plástica. Eu não tinha essa noção. O outro pode ver, eu não via. Não consigo fazer nada superficialmente. Não estou preocupado se meu trabalho esteticamente agrada. Gosto de experimentar”.

Alguém questiona como está a memória da dança e do teatro no Estado. O iluminador Expedito di Montebranco, que também é ator e diretor teatral, acha que a dança esta mais organizada. “Nós tivemos a Semana do Teatro. Eu me questiono que as pessoas que forem fazer teatro hoje, quais seriam os motivos que elas teriam para fazer teatro. Aqui, como iluminador, vejo como a dança se organiza, [e como ator e diretor teatral,] vejo como o teatro se organiza”.

“A dança sul-mato-grossense está engatinhando em termos de mundo. Fizemos dança durante muito tempo para nós mesmos. Quando olhamos para os grandes centros, para o mundo, a gente se coloca inferior por sermos periféricos. Nossa situação, nossas dificuldades, são as mesas de qualquer artista no País. Esse é um lugar bom para se produzir. A dança precisa parar de olhar para o seu umbigo e olhar para o mundo”, diz Chico Neller.

Sandra diz que uma pessoa como ela, que se desloca de outro lugar para conhecer a produção daqui, pretende iniciar um diálogo. “Às vezes o artista está tão envolvido em sua prática que não há tempo para refletir. A presença da universidade é importante para essa memória. Talvez algum acadêmico se interesse em pesquisar a história. Acredito que isso vai acontecer naturalmente com os cursos de graduação”.

Outra pergunta que surgiu da plateia é como os bailarinos se prepararam fisicamente e psicologicamente. O bailarino Paulo Henrique responde que realizam aulas às segundas, quartas e sextas e ensaios aos sábados, e que graças ao Prêmio Célio Adolfo foi possível ao grupo contratar o preparador físico Júlio César Floriano. “Temos aulas de pilates, ensaiamos bastante para não nos machucar. Mas o impacto [que causamos com os movimentos] é mais pelo barulho”.

A bailarina Debora Rosa Higa completa: “O Júlio trabalhou corpo e mente junto. Este [‘Mudança’] foi o trabalho da companhia em que a gente mais conversou, em que mais pudemos colocar nossa experiência nele”.

A conversa foi encerrada e o público voltou para casa. Mas as apresentações da Semana Pra Dança 2015 continuam nesta quinta-feira (20), com o espetáculo “De Passagem”, da Cia Dançurbana. Os ingressos são limitados a 27 pessoas, que é a quantidade que cabe dentro do ônibus em que acontecerá o espetáculo.

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